Mais
eficiente que a memória do computador, seu corpo registra tudo que
aconteceu com você desde a infância até agora. O psicólogo e teólogo
francês Jean-Yves Leloup relaciona símbolos arcaicos com várias partes
do corpo e esclarece as causas físicas, emocionais e espirituais das
boas sensações e de algumas doenças.
Uma página em branco. É assim o corpo novinho em folha do
recém-nascido. Desde o instante do nascimento e a cada fase da vida, a
pele, os músculos, os ossos e os gestos registram dados muito precisos
que contam nossa história. “O homem é seu próprio livro de estudo, basta
ir virando as páginas para encontrar o autor”, diz Jean-Yves Leloup,
teólogo, filósofo e terapeuta francês.
É possível escutar o corpo e conhecer sua linguagem, que muitas vezes
se expressa por sensações prazerosas, por bloqueios ou pela dor, que
nada mais é do que um grito para pedir atenção. “O corpo não mente. As
doenças ou o prazer que animam algumas de suas partes têm significados
profundos”, revela Leloup.
Ele nos convida a responder algumas questões sobre pés, tornozelos,
ventre, genitais, coração, pulmões e muitas outras partes. Elas podem
ser nosso guia em uma viagem de autoconhecimento que toca em aspectos
físicos, emocionais e espirituais: “Primeiro, podemos notar qual é nosso
ponto fraco, o lugar de nosso corpo em que vêm se alojar, regularmente,
a doença e o sofrimento. Há a escuta psicológica pela qual podemos
prestar atenção no medo ou na atração que vivemos em relação a algumas
partes do corpo. E há ainda a escuta espiritual. O espírito está
presente em nosso corpo, e certas doenças e algumas crises são
manifestações do espírito, que quer trilhar um caminho, que quer
crescer, que quer desenvolver-se em membros que lhe resistem”, diz ele. E
continua: “Algumas depressões estão ligadas a fatores emocionais, a um
rompimento, uma perda, uma falência. Mas há também depressões
iniciáticas, em que a vida nos ensina, por meio de uma queda, um
acidente, que devemos mudar nosso modo de viver”.
Descubra a seguir quais são os símbolos associados por Jean-Yves
Leloup a cada parte do corpo e responda às questões, que facilitam a
reflexão e o reconhecimento do que está impresso em você. Boa viagem!
Pés, as nossas raízes
“Será que experimentamos prazer em estar sobre a terra? Podemos
imaginar o corpo como um árvore. Se a seiva está viva em nós, ela desce
às raízes e sobe até os mais altos galhos. É de nosso enraizamento na
matéria que depende nossa subida à luz. É da saúde de nossos pés que vem
o enraizamento”, explica Leloup.
Ele lembra que em diferentes práticas de ioga há a purificação dos
pés, que são mergulhados na água salgada. “Pelos pés podem escorrer
nossas fadigas e tensões.”
“A palavra pé, podos, em grego, relaciona-se à palavra paidos, que
quer dizer criança. Cuidar dos pés de alguém é cuidar da criança que o
habita. Perguntei a um sábio: ‘O que posso fazer para ajudar alguém?’
Ele respondeu: ‘Lembre-se de que essa pessoa foi uma criança, que ainda é
uma criança. E que tem dor nos pés.’”
Preste atenção: verifique se seus pés são seu ponto fraco. Como você
se apoia sobre eles? Em seguida, toque-os, sentindo ossos, músculos e
partes mais ou menos sensíveis. Quais são suas raízes familiares? Quais
as expectativas de seus pais em relação a você? Qual seu sentimento em
relação a filhos?
Tornozelos, a possibilidade de ir em frente
Termômetro da rigidez ou da flexibilidade com que levamos a vida, os
tornozelos têm relação direta com o momento do nascimento. “Por que esse
é também um momento de articulação entre a vida dentro e fora do útero.
Alguns de nós conheceram dificuldades e viveram até traumas nesse elo
que une a vida fetal com o mundo exterior. O corpo guardou essa memória e
a expressa na fragilidade dos tornozelos”, diz o filósofo.
Segundo Leloup, os tornozelos simbolizam também o refinamento da
vida, as relações íntimas e a articulação do material com o espiritual.
As pessoas em que o tornozelo é o ponto fraco têm dificuldade de avançar
nos vários aspectos da vida. Dar um passo a mais é ir além de nossos
limites e também saber aceitar o que se é, seja isso agradável ou não.
“Essa é a condição para ir mais longe”, finaliza ele.
Preste atenção: você costuma ter dor nos tornozelos? Essa região é
rígida ou flexível? Sofreu entorses? Em que momentos de sua vida eles
ocorreram? É difícil avançar em direção ao que você quer? Qual é o passo
que você precisa dar e o passo ao qual resiste?
Joelhos, o apoio para dar e receber colo
A flexibilidade é uma das qualidades importantes para que os joelhos
sejam saudáveis. “Quando eles são rígidos, é provável que surjam
problemas na coluna vertebral e nos rins”, lembra Leloup, que nos revela
o significado mais profundo dessa parte do corpo. “Em algumas línguas,
estranhamente há uma ligação entre a palavra filho e a palavra joelho.
Em francês, por exemplo, genou, joelho, tem a mesma raiz da palavra
générer, gerar. Em hebraico, joelho é berekh, e também bar e bèn, que
significa filho. Assim, ser filho, ser filha é estar no colo, envolvido
por esse gesto, que é o elo entre os joelhos e o peito. Temos
necessidade de dar e receber essa confirmação afetiva. E manter alguém
no colo, sobre os joelhos serve para manter o coração aberto”, finaliza.
Preste atenção: observe como são seus joelhos. Eles são flexíveis,
rígidos, doloridos? É bom tocá-los ou não? Quem o pegou no colo quando
você era criança? Esse gesto de intimidade é familiar para você? Qual a
sensação? E você, para quem dá colo (seja fisicamente, seja como símbolo
de acolhimento)?
Genitais, a energia de vida
O teólogo Jean-Yves Leloup fala dos tipos de amor e prazer, dos
traumas e das sensações vividos na infância que marcam para sempre nossa
sexualidade. Ele ressalta que o encontro de dois corpos pode ser mais
que físico. “A representação mais primitiva de Deus foi encontrada na
Índia e são o lingan e a ioni, o símbolo fálico masculino e o genital
feminino. Assim a representação do sexo foi a primeira feita pelo homem
para evocar Deus – porque o sexo é onde se transmite a vida. Dessa
maneira, passa a ser o local da aliança, algo de muito sagrado”,
considera Jean-Yves Leloup. “Portanto, a sexualidade não é somente
libido. Essa libido pode tornar-se paixão, passar através do coração e
transformar-se em compaixão. É sempre a mesma energia vital, que muda e
se transforma de acordo com o nível de consciência no qual nos
encontramos.”
Preste atenção: quais são suas dores ou doenças relacionadas aos
órgãos genitais? Você sofre desses males? Qual a sensação diante dos
seus genitais (vergonha, repulsa, prazer)? Qual sua postura em relação à
sexualidade (à sua própria e ao sexo no contexto cultural)?
Ventre, o centro processador de emoções
Estômago, intestinos, fígado, vesícula biliar, baço, pâncreas, rins
são os órgãos vitais abrigados em nosso ventre. Eles são responsáveis
pela transformação do alimento em energia, pela absorção de nutrientes e
pela eliminação de toxinas.
Emoções como raiva, medo, prazer e alegria acertam em cheio essa
região e também precisam ser digeridas. Leloup aponta que “o perdão tem
uma virtude curativa porque podemos tomar toda espécie de medicamento,
sermos acompanhados psicologicamente, mas há, por vezes, rancores que
atulham nosso ventre, nosso estômago, nosso fígado”. Ele destaca que
todas as partes do corpo lembram a importância de respeitar o tempo de
digestão e assimilação de tudo que nos acontece de ruim e também de bom.
Preste atenção: como é sua digestão? Quando você tem uma forte
emoção, sente frio na barriga ou alguma reação na região? Quais foram os
fatos difíceis de ser digeridos em sua vida? O que há por perdoar?
Coração e pulmões, o pulso vital
Esses dois órgãos estão intimamente ligados a nossa respiração. “O
coração é um dos símbolos do centro vital, ele é o centro da relação. E é
importante observar como nossa vida afetiva influencia nossa
respiração. Às vezes, nos sentimos sufocar porque não correspondemos à
imagem que os outros têm de nós, e isso também impede que o coração bata
tranquilamente. Para alguns, querer ser normal a qualquer preço, querer
agir como todo mundo, pode ser fonte de doenças”, assinala o psicólogo
Jean-Yves Leloup.
Agir de acordo com suas vontades mais genuínas e aceitar o que se é,
mesmo que isso não combine com o grupo, pode ser uma das formas de se
libertar e sair do sufoco.
Preste atenção: você já teve períodos prolongados de angústia ou
tristeza? O que liberta sua respiração e o que o sufoca? Você se
preocupa muito com a imagem que as pessoas têm de você? Já parou para
ouvir as batidas de seu coração e o das pessoas a quem você ama? O que
deixou seu coração partido? O que o fez bater feliz?
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